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Siameses... só que não

Woody Luis
















Esta é da série "teorias delirantes que criei": para mim, Woody Allen e Luis Fernando Verissimo são gêmeos não-idênticos separados no nascimento, com características físicas bem diferentes superadas pela genética que os une.

Woody é nova-iorquino e Verissimo, porto-alegrense; um trabalha (principalmente) com cinema e o outro com literatura, mas as crônicas que escrevem ou filmam parecem se aplicar a qualquer situação da vida cotidiana, seja quando namoram com Bergman ou Borges e dão toques intelectualizados às palavras, seja quando registram o dia-a-dia do homem comum.

Luis Fernando morou quando criança nos Estados Unidos e foi alfabetizado em inglês - seu pai fora convidado para dar aulas no país. Nova Iorque, assim, é bem familiar ao gaúcho e sua paixão pelo jazz rende até hoje memoráveis contos que retratam fatos como assistir a Charlie Parker em bares enfumaçados. Verissimo toca saxofone como hobby, assim como Woody toca clarinete e é um grande conhecedor de música americana - é famosa a recusa dele em receber seu Oscar por "Noivo neurótico, noiva nervosa" alegando não poder comparecer à cerimônia por ser dia de tocar com seu conjunto de "dixie".

Quando vi o filme "Match Point" ("Ponto Final", em português), minha teoria do gêmeo que sente à distância o que o irmão faz ganhou mais força: a história do homem que tenta se livrar da prova do crime jogando a jóia no rio Tâmisa está presente na crônica "A verdade", que Verissimo escreveu há muitos anos. Talvez seja um tema recorrente e universal, mas os contornos que os dois dão às suas narrativas aproximam (e muito) os artistas.

Apesar das semelhanças e coincidências, Woody é Woody e Verissimo é Verissimo. Tentar tomar um pelo outro, além de absurdo, pode levar a consequências bastante frustrantes - como um guarda-roupa inadequado ao norte-americano, que é mais baixo que o brasileiro, ou esperar que Luis dirija um filme com a competência de Allen.

Da mesma forma, nossos processos complexos podem se espelhar em situações similares para recriarem condições necessárias ao seu bom funcionamento - mas dando a necessária atenção às diferenças que existem entre os contextos. Costumo ouvir com frequência termos como "padronização", "re-uso" e "reaproveitamento" que, se mal usados, introduzem distorções e resistências nos processos de trabalho. Um belo projeto de uma ponte japonesa pode ser uma referência para a que pretendemos construir em nossa cidade - porém, os materiais usados podem ter levado em consideração requisitos específicos para o local original de construção e, quando da contextualização ao nosso caso, podem possuir custos proibitivos ou dificuldade de obtenção. Mais crítico ainda, quando tratamos de pessoas, tentar enquadrar a ação de seres humanos em procedimentos frios e distantes das realidades locais, apenas porque um padrão foi definido por uma unidade central, pode trazer danos irreversíveis ao desempenho do processo. Devemos nos lembrar que a ideia original de padrão busca estabelecer a comunicação entre os elementos de um sistema/processo - e não a perda de flexibilidade. Quando formos modelar nosso processo, devemos representar o mais próximo possível a realidade, permitindo que Luis seja Luis e que Woody seja Woody.

Ah, e se você acha que "A verdade" e "Match Point" são uma simples coincidência, compare a cena de "Para Roma com Amor" em que a esposa se encanta com o ator de cinema e a crônica "Zona Norte, Zona Sul", em que Vânia é surpreendida pelo assaltante "Gatão"...

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