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A história, como farsa...

Há uma frase atribuída a Karl Marx de que a história se repete primeiro como tragédia, depois como farsa. É provável que todos nós tenhamos vivido "a mesma" situação repetidas vezes em nossas vidas, nunca exatamente como a história original, mas com requintes contextuais - por exemplo, projetos que são tratados como novidade apesar de você ter guardada uma cópia de um similar que foi abandonado há cinco anos atrás.



Em 2007 eu coordenava um escritório central de projetos de modernização de processos e estávamos incorporando novos método, ferramenta e forma de atuar junto às unidades negociais da empresa. Uma das primeiras iniciativas sob tal enfoque consistia na atualização tecnológica de um grade sistema de concessão de empréstimos, a maior carteira do Brasil no segmento. E foi aí que a tal repetição da história ocorreu...

Cerca de 25 anos antes meu pai havia sido o chefe daquela unidade de empréstimos e enfrentara uma atualização de plataforma tecnológica do sistema automatizado. O trabalho já durava alguns meses e um dia um dos funcionários de sua equipe veio se queixar da complexidade do projeto em curso:

- Puxa, a coisa toda é muito difícil! Temos cerca de dois milhões de alternativas distintas a serem tratadas pelo programa.

- Como assim? Se a carteira global de contratos tem cerca de um milhão de contas, como o programa pode ter um número maior de casos para tratar?

Mais de duas décadas depois, o mesmo problema estava sendo discutido pelas equipes envolvidas no projeto. A premissa tradicional que os consultores de processos e de TI adotavam levava a tais percepções distintas. Uma forma de abordar o problema é considerar que todo contrato assinado é "igual", pois se refere ao mesmo tipo de empréstimo. Apesar de funcionar bem em um primeiro momento, tal representação é um pouco afastada da realidade, e isso fica mais claro quando começamos a refletir que, embora sendo contratos da mesma carteira, os dados individuais são específicos, assim como as condições que começam a ocorrer quando da vida propriamente dita dos contratos. Por exemplo, eu e você podemos assinar um contrato sob as mesmas condições na mesma data e na mesma agência bancária, mas meus dados pessoais são diferentes dos seus. Além disso, digamos que um ano depois da assinatura eu consiga um desconto especial na justiça ao qual você não tem direito, ao passo que você resolve amortizar algumas parcelas finais e modifica o seu saldo devedor. Falando claramente, a forma mais correta de modelar tal processo é considerar cada um dos contratos como um elemento paralelo aos demais, sendo que o limite para tal complexidade acaba sendo, de fato, o número de contratos existentes na carteira. Neste caso, seria impossível termos mais condições distintas que a própria quantidade total de empréstimos.

Voltamos, assim, àquele ponto em que devemos decidir qual a melhor forma de representação dos processos (que depois serão automatizados): um simples fluxo de atividades que considera "tudo farinha do mesmo saco" - por exemplo, dez atendentes em um balcão como sendo clones perfeitos um do outro e um milhão de contratos exatamente iguais - ou uma rede de relacionamentos que permite a identificação e a gestão das diferenças observadas no mundo real. As figuras abaixo ilustram de forma bastante simplificada tais pontos de vista (a primeira se refere a uma unificação da manutenção do contrato mas que, na prática, gera árvores complexas de possíveis alternativas; a segunda já trata desde a modelagem do processo cada contrato como um elemento único).



Pode ser mais difícil modelar, mas a última alternativa costuma dar melhores resultados.
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