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A modelagem de processos de negócio na era dos dados

Neste post falo sobre como o desenvolvimento dos recursos e ferramentas computacionais das últimas décadas, especialmente nas áreas conhecidas como Big Data e Inteligência Artificial, pode beneficiar iniciativas de modelagem de processos de negócio nas organizações.
Já faz tempo que as organizações de médio e grande porte, tanto nos setores público quanto privado, se conscientizaram da importância de identificar e controlar seus processos de negócio. Ao longo desse tempo, muitas iniciativas de modelagem de processos foram desenvolvidas, aplicando as mais diversas metodologias e ferramentas, resultando em níveis de sucesso bastante variados. Podemos dizer que existe hoje um razoável consenso de que iniciativas de modelagem e redesenho dos processos de negócios são necessárias para assegurar os níveis de desempenho atualmente demandados das organizações. Apesar disso, há muitos questionamentos quanto aos esforços e investimentos realizados frente aos resultados obtidos.
De fato, a modelagem e redesenho de processos pode ser um empreendimento árduo e penoso. Envolve mais que o desenho de um fluxo de atividades, uma representação simbólica de quem faz o que, onde e quando. Os processos de negócio não são objetos estáticos, que mudam apenas sob controle dos níveis gerenciais da organização. Ao contrário, desde sua implantação e ao longo de todo seu ciclo de vida, os processos sofrem contínua pressão de mudanças devido a forças internas da organização e do meio externo.
Assim, mesmo quando o objetivo é a revisão de um processo existente, onde o conjunto de atividades e sua sequência de execução são supostamente conhecidos, constata-se que a teoria na prática é outra. Na verdade, o processo praticado apresenta diferenças significativas em relação ao modelo originalmente prescrito. E a percepção das mudanças sofridas pelos processos não é homogênea na organização, nem quando atravessamos horizontalmente a estrutura departamental, nem quando atravessamos a hierarquia funcional.
Em geral, não existe um consenso real entre as partes envolvidas no processo de negócio sobre os detalhes de como ele é efetivamente executado. Frequentemente, a percepção da existência de problemas e da necessidade de mudanças é compartilhada, mas há muita incerteza sobre a identificação dos problemas, suas causas e possíveis soluções. E sem um consenso sobre onde, quanto e quando mudar, não será viável realizar com sucesso uma iniciativa de modelagem e redesenho.
Disso decorre que a modelagem do processo não pode se restringir a levantamentos documentais e entrevistas individuais. É preciso realizar ações que promovam o contato e interação entre as partes interessadas (gestores, executantes e clientes), possibilitando a troca de informações e experiências que levem ao desenvolvimento de um razoável consenso sobre a realidade atual do processo e as mudanças necessárias para melhorar seu desempenho. Entretanto, isso significa que as equipes envolvidas deverão dedicar muito esforço e tempo de dedicação para as atividades de modelagem. E claro, quando esse esforço adicional não é previsto no plano inicial, ele resulta em aumento de custos e incertezas no projeto.
Por outro lado, na maioria das organizações de médio e grande porte, os processos de negócio são apoiados por um ou mais sistemas de informação. Através desses sistemas os agentes envolvidos na execução das atividades do processo (pessoas e softwares) registram grande número de informações sobre o conteúdo e andamento de cada ocorrência do processo. Não seria possível explorar esses repositórios de dados de modo a gerar informações e novas perspectivas sobre os processos executados que possibilitem evitar os problemas apresentados acima ou, pelo menos, reduzir seus impactos?
Este é o objetivo da Mineração de Processos, uma metodologia que combina técnicas e ferramentas desenvolvidas nas áreas de mineração de dados e inteligência artificial para conectar o modelo do processo com a realidade operacional.
O ponto de partida da Mineração de Processos é o Log de Eventos, onde cada evento corresponde a uma atividade que foi executada para atender uma ocorrência do processo de negócio. Em outras palavras, cada evento é uma atividade executada como parte de um caso do processo. O conjunto das atividades de um caso, ordenadas na ordem em que aconteceram, compõem um caminho de execução do processo, que vamos chamar de traçado.
O diagrama abaixo representa um exemplo de um Log de Eventos com apenas 4 casos. No Caso 1 vemos uma sequência de 3 atividades (T1, T2 e T3), constituindo um primeiro traçado. No Caso 2, temos uma outra sequência de 3 atividades (T1, T3 e T4) que define um segundo traçado. No Caso 3, temos uma sequência um pouco diferente com 4 atividades, sendo 2 em paralelo, definindo mais um traçado. Finalmente, o Caso 4 repete a mesma sequência de atividades do Caso 2 e portanto repete o seu traçado. No Log então, temos 4 Casos mas apenas 3 Traçados:

Um modelo que represente as diversas possibilidades de execução do processo no Log deve contemplar todos os traçados contidos nele. Na figura seguinte, um modelo possível do exemplo é mostrado como diagrama na notação BPMN (Business Process Model Notation). Segundo esse diagrama:
  • o processo sempre inicia pela execução de T1;
  • em seguida, pode ser executada apenas T2, ou apenas T3, ou ambas;
  • após T2 pode ser executada T3 ou T4, mas não ambas;
  • após T3 sempre é executada T4;
  • o processo termina após T3 ou T4;

Notem que mesmo neste exemplo simples, com apenas 4 tipos de eventos (T1 a T4) e 3 traçados distintos, o modelo que representa o comportamento do processo registrado já envolve uma certa complexidade. Para processos com maior diversidade de eventos (atividades possíveis de execução) e Logs de Eventos com maior número de casos, a geração de modelos representativos torna-se uma tarefa bastante complexa. De fato, foi apenas nesta última década que os avanços no desempenho das plataformas computacionais, junto ao desenvolvimento de técnicas para mineração de dados e aplicação de algoritmos de inteligência artificial possibilitaram produzir ferramentas capazes de identificar padrões complexos em grandes volumes de dados e extrair modelos efetivamente representativos dos processos de negócio.
Além do desenho do modelo, a Mineração de Processos possibilita também visualizar informações sobre a frequência de execução das atividades (ex.: quantas vezes T2 foi executada) e sobre o desempenho (ex.: qual o tempo médio de execução de T3). O diagrama abaixo ilustra um exemplo de um Log de Eventos com 150 ocorrências do Traçado 1, 250 ocorrências do Traçado 2 e 100 ocorrências do Traçado 3. O número no interior da atividade mostra o número de vezes que foi executada, enquanto que o número associado ao caminho mostra o valor médio do intervalo entre a execução das duas atividades ligadas por ele. 

Neste exemplo, o Log de Eventos contém apenas o mínimo de dados sobre cada evento (identificação do caso, nome da atividade, data/hora de execução da atividade). Mas em geral, quanto mais informações forem disponibilizadas no Log mais poderemos explorar as funcionalidades de visualização e análise oferecidas pelas ferramentas de Mineração de Processos.
Assim, com a Mineração de Processos é possível transformar as atividades de modelagem e análise tradicionais, aplicando métodos que agilizam a obtenção de modelos do processo com base nas evidências providas pelos dados registrados (representando o processo como executado) e, colocam em segundo plano, definições baseadas em modelos defasados ou pressões de agendas individuais (representando o processo como previsto).
Mais detalhes sobre a Mineração de Processos em um próximo post.
Até lá.

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