Com a recente entrada em consulta nacional do FACIN, o
Framework de Arquitetura Corporativa e Padrões de Interoperabilidade, alguns
segmentos de mercado passam a enfrentar o dilema constante: a adoção de padrões
e normas é ou não obrigatória?
O uso de normas técnicas tem se mostrado fundamental para
que fornecedores sejam capazes de competir em um mercado global com minimização
de barreiras técnicas que possam, eventualmente, impedir a adoção de seus
produtos e serviços. Tornou-se também fundamental para o aspecto de proteção ao
consumidor, ao servir de base para a resolução de problemas de incompatibilidade
entre produtos e serviços de fornecedores diversos. No caso específico de
telecomunicações, as interações entre redes, protocolos e serviços de uso
constante e universalizado jamais poderiam existir sem uma base sólida de
normalização internacional em que todos as partes interessadas (governo,
academia e setor privado) estejam plenamente envolvidos.
Ao analisar as políticas das grandes organizações globais de
normalização (ISO, IEC, ITU) que, em sua essência, promovem a interação
constante de governos, setor privado e academia, vê-se que a adoção de normas técnicas
é, em princípio, voluntária, isto é, o fato de ter sido publicada uma norma não
implica necessariamente na sua adoção imediata e obrigatória por todos os
participantes afetados no mercado. No caso de uso de normas para suporte a
políticas públicas existe um guia publicado em http://www.iso.org/sites/policy/.
Eventuais divergências que possam existir entre normas e padrões
publicados ou em desenvolvimento podem ser apresentadas e argumentadas nos fóruns
adequados, nos quais o Brasil tem plena participação, mas nem sempre uma
estruturação adequada. No caso de normas dos sistemas ISO e IEC, a participação
nas comissões da ABNT nos permite propor alterações, criação ou aposentadoria
de normas e padrões. No caso da ITU, a interação com os grupos da Anatel é o
caminho para uma maior participação. Deve-se levar em conta, porém, que os
resultados são baseados em processos de consenso entre todos os participantes globais,
o que não garante a adoção plena das propostas dos países. Tenho uma frase bem
simples sobre o processo de consenso: Todos perdem um pouco, mas perdem dentro
de limites aceitáveis.
Há, porém, que se resolver o aspecto da adoção de normas que servirão de
base formal da interoperabilidade, adequação de processos e gestão de recursos de
um país. Ao eleger uma base preferencial de normas e padrões a serem adotados
cria-se o suporte mínimo necessário para a garantia de comunicação e serviços
eletrônicos sobre a qual regras, regulamentos, instruções e leis podem ser criados
e aperfeiçoados. A preferência, porém, acaba criando uma certa obrigatoriedade
da adoção dessas normas e padrões pelos envolvidos, visto que se torna a base
mínima sobre a qual existem as garantias de interação. Deve-se, portanto, tomar
cuidado para evitar o engessamento do mercado com a determinação de
preferências. Estabelecer as preferências com base em normas e padrões estruturantes
permite que a adequação à realidade e evolução dos mercados possa ser
rapidamente absorvida pela regulamentação sem necessidade de revisões constantes
e penosas para todos.
Neste aspecto, a adoção de normas e padrões de governança,
arquitetura de referência, vocabulários e definições tende a criar um
conjunto ideal de elementos sobre os quais podem ser montadas as
regulamentações e fundamentos da interação entre participantes e
interoperabilidade entre sistemas, com regras claras e, mais importante, com o
esclarecimento sobre o comportamento esperado das partes e o estabelecimento de
um vocabulário estável, o que promove a minimização interpretações divergentes
e eventuais disputas judiciais.
O FACIN, o e-PING e outras iniciativas são, portanto, peças importantes
no estabelecimento dessas bases sólidas e deve-se, a todo custo, evitar que se
tornem iniciativas que engessem o mercado. O processo de consulta pública deve,
então, ser usado pela sociedade como fórum adequado de discussão, argumentação
e sugestão.
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