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Além da Cadeia de Valor

Segundo o BPM CBOK, o termo “negócio” refere-se a pessoas que interagem para executar um conjunto de atividades com objetivo de criar valor para seus clientes e outras partes interessadas (stakeholders). Abrange todos os tipos de organizações, públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos, e de qualquer porte ou segmento de negócio. Assim, a criação de valor é o que justifica a existência das organizações e de seus negócios.

Apesar de sua importância, o valor criado pelos negócios das organizações nem sempre é claramente definido e divulgado. Em organizações estabelecidas há muito tempo é comum que os produtos e serviços fornecidos se confundam com os objetivos que justificaram sua criação. Mais recentemente, o movimento Lean Startup revigorou a criação de valor como motivação básica dos negócios, e popularizou alguns instrumentos para trabalhar o conceito e sua formulação.

Independentemente de como seja formulada, a criação de valor depende da execução de diversas atividades interligadas que tratam, por exemplo, desde a apresentação da demanda pelo cliente, passando pelos trabalhos realizados internamente para atender a demanda, até a entrega da demanda atendida ao cliente.  Essa sequência de execução constitui um “fluxo de valor” que representa como a organização cria valor para seus clientes, de ponta a ponta. Estes “fluxos de valor”, que agrupam as diversas atividades executadas para criação do valor, são identificados como processos de negócio. 

O processo de negócio pode ser definido como um conjunto de atividades interligadas que são executadas com o objetivo de produzir os resultados determinados por uma lógica de criação de valor. O processo acontece através da interação de agentes (pessoas, organizações e sistemas), em um “fluxo de trabalho” onde o resultado do trabalho de um é passado para outro, de forma  a alcançar o objetivo de negócio comum. A gestão dos processos de negócio, ou Business Process Management (BPM) trata da gestão desses fluxos de trabalho de forma a assegurar a eficácia do processo e o nível de eficiência adequado na execução das atividades.

Dado que a criação de valor depende dos processos de negócio, é desejável elaborar modelos que identifiquem esses processos e como eles se relacionam para gerar o valor do negócio. O modelo de criação de valor baseado em processos mais conhecido é o da “Cadeia de Valor” proposto pelo Michael Porter. Nesse modelo, os processos são classificados em primários (ou finalísticos) e secundários (ou de apoio), sendo que o primeiro grupo é composto pelos processos diretamente ligados à entrega das demandas de produtos e serviços, encadeados em uma sequência de execução frequentemente denominada de “fluxo de valor”. O segundo grupo é composto por processos que não afetam diretamente a entrega de valor aos clientes, mas são necessários como apoio para execução e gestão dos processos primários.

A figura abaixo mostra um exemplo genérico de “Cadeia de Valor”. Os processos finalísticos são apresentados atravessando na horizontal as áreas funcionais, cada uma adicionando parte do valor da entrega final. No topo da figura, em posição ortogonal, os processos de apoio provêm infraestrutura e serviços para a execução adequada dos processos finalísticos.


Apesar da “Cadeia de Valor” ser um modelo de grande sucesso de difusão e adoção, ao ponto de se tornar um padrão “de fato”, ele é baseado na indústria de produção em série e pode não ser a lógica de criação de valor mais adequada para organizações baseadas em serviços. Entre outras lógicas de criação de valor que oferecem modelos mais adequados para organizações de serviços estão os modelos de “Escritório de Valor” e “Rede de Valor” propostos por Stabell e Fjelstad.

O modelo “Escritório de Valor” descreve organizações que criam valor resolvendo problemas de seus clientes através da aplicação de conhecimento e tecnologia, de modo a promover mudanças que levem o cliente de um “estado atual” para um “estado futuro” desejado. Em geral, o conjunto de atividades executadas e os recursos utilizados não são padronizados, são identificados e alocados em função das características específicas de cada caso. A sequência de execução das atividades é influenciada pelos resultados parciais do processo, ou seja, não está pré-determinada por um modelo de processo

Exemplos dessa lógica de criação de valor são as organizações de prestação de serviços profissionais e de pesquisa e desenvolvimento. A figura abaixo mostra exemplo desse modelo, onde os processos finalísticos seguem uma sequência iterativa de execução, cada processo adicionando parte do valor da entrega final em ciclos de número indeterminado.


O modelo “Rede de Valor” descreve organizações que criam valor através da operação de uma rede que interliga seus clientes de forma a facilitar o relacionamento e trocas entre eles. Através de contratos que estabelecem requisitos e obrigações mútuas, a organização atua definindo regras, administrando a inclusão/exclusão de membros e monitorando os relacionamentos entre eles. Para seus clientes o valor da rede depende do conjunto de clientes com os quais a rede o habilita a interagir, ou seja, o tamanho e abrangência da rede afeta o valor percebido pelos clientes. O atendimento das demandas dos clientes individuais envolve atividades cuja execução depende dos contratos estabelecidos com outros clientes e da operação adequada da infraestrutura de conexão, o que leva a uma lógica de processos primários simultâneos e interdependentes. 

Exemplos são os serviços de correios e postagens, bancos, companhias de seguros, operadoras de telecomunicações e redes sociais. Um exemplo de “Rede de Valor” é mostrado na figura abaixo, onde se observa os processos finalísticos apresentados sobrepostos, representando uma execução simultânea e contínua, onde a entrega de valor de cada processo é, pelo menos parcialmente, dependente das entregas dos demais.

A classificação de processos primários ou de apoio pode variar conforme o modelo adotado, ou em função de características específicas da organização. Por exemplo, em um modelo de “Escritório de Valor” o processo de Gestão de Recursos Humanos pode ser um processo primário, dada sua criticidade para obtenção de resultados de valor para os clientes.  Por outro lado, em uma “Rede de Valor” o processo de Desenvolvimento Tecnológico pode ser crítico para captação de novos clientes para a rede.

Finalmente, muitas organizações podem se enquadrar em mais de uma lógica de criação de valor. Por exemplo, em organizações de grande porte é possível que uma unidade de P&D seja melhor modelada como “Escritório de Valor”, embora a organização como um todo se enquadre como “Cadeia de Valor”.

Para quem se interessar por mais, seguem algumas referências:
  • BPM® CBOK® v3.0, ABPMP-Association of Business Process Management Professionals, 2015
  • Porter, Michael E., "Competitive Advantage". 1985, Ch. 1, pp. 11-15. The Free Press. New York
  • Stabell, C.B. and Fjelstad, O.D. (1998). “Configuring Value for Competitive Advantage: On Chains, Shops and Networks”, Strategic Management Journal, 19, 413-437.
  • The Startup Owner's Manual: The Step-By-Step Guide for Building a Great Company, Steve Blank & Bob Dorf,K&S Ranch 2012
  • The Lean Startup: How Today's Entrepreneurs Use Continuous Innovation to Create Radically Successful Businesses, Eric Ries,Crown Business 2011


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