Por
Thiago Ávila*
Dando
continuidade à nossa série de artigos sobre Dados Abertos
(conectados), vamos aprofundar a partir deste artigo, as 10
melhores práticas para a publicação de Dados Abertos Conectados
já apresentados aqui no blog, aplicando-os no contexto
Governamental. No âmbito da dissertação de mestrado, “Uma
Proposta de Modelo de Processo para Publicação de Dados Abertos
Conectados Governamentais”[1],
desenvolvi uma revisão de literatura que identificou 70
recomendações para a publicação de Dados Abertos Conectados
Governamentais, distribuído entre as 10 melhores práticas, que
serão explorados em continuidade a esta série de artigos aqui no
blog.
Para
o desenvolvimento da revisão de literatura desta pesquisa, foram
estabelecidas as
seguintes atividades:
- Identificação e estabelecimento de um trabalho relacionado principalmente as atividades de publicação de dados conectados - Melhores Práticas para Publicação de Dados Conectados" do W3C [6];
- Identificação de processos de publicação de dados governamentais oficiais das nações da América do Sul e artigos científicos e documentos relacionados disponíveis na literatura;
- Detecção e extração de recomendações que guiem as instituições governamentais a produzirem dados abertos e dados abertos conectados;
- Associação das recomendações às Melhores Práticas estabelecidas pelo trabalho relacionado principal (vide item 1);
A
principal contribuição desta revisão de literatura foi a extração
de um conjunto de recomendações que poderão ser adotadas na
publicação de dados abertos e dados abertos conectados no setor
público. Tais recomendações foram incorporadas a proposta de
modelo de processo desta pesquisa.
Para
identificar recomendações voltadas a implementar a primeira melhor
prática, “Preparação de Partes Interessadas”,
foi estabelecida a seguinte questão de pesquisa: “O que os
processos de publicação de dados abertos (conectados) recomendam a
ser feito para contemplar a melhor prática de Preparar Partes
Interessadas?"
1. Preparação de Partes Interessadas
De
acordo com o W3C[7] a preparação é crucial para o sucesso de um
projeto de gestão da informação. Ao compartilhar com as partes
interessadas (stakeholders) os benefícios esperados pelo
projeto, as expectativas são niveladas entre as partes bem como pode
ser realizado o alinhamento com a missão da instituição que está
realizando o projeto.
Além
disso, os conceitos sobre produção e gestão de dados e informações
passam a ser conhecidos para os técnicos e gestores envolvidos. Por
outro lado, a não realização desta etapa pode inviabilizar um
projeto, pois os gestores competentes as realizações do projeto
podem não apoiar nem disponibilizar os recursos necessários ao
mesmo e consequentemente, os profissionais necessários ao sucesso do
mesmo não estarão devidamente engajados. Cumpre destacar que esta
prática foi identificada com maior frequência nos planos e
processos de abertura de dados com origem nos órgãos governamentais
e consequentemente estando pouco presente nos artigos científicos.
Na
sequência serão apresentadas as recomendações identificadas nos
processos que poderão auxiliar a incorporação desta melhor prática
em atividades de publicação de dados.
1.1. Identificar os benefícios para a abertura de dados
A
identificação de benefícios para os interessados é um elemento
motivacional no desenvolvimento de qualquer projeto. Nesta direção
o processo “Methodology for publishing datasets as open data –
COMSODE” apresenta um rico detalhamento de como esta atividade
deve ser desenvolvida, sugerindo que sejam discutidas as motivações
e benefícios gerais (para a organização) e específicos (para cada
conjunto de dados a ser aberto) decorrente de um processo de abertura
e publicação de dados. Dentre os principais benefícios gerais,
podemos listar [5]: (i) Aumentar a transparência; (ii) Estimular o
crescimento econômico; (iii) Melhorar os serviços governamentais e
capacidade de resposta do governo; (iv) Reduzir as solicitações de
dados, considerando que haverá uma oferta proativa de dados
governamentais; (v) Incentivar a reutilização de dados; (vi)
Melhorar as relações públicas e as atitudes relacionadas ao
governo; e (vii) Melhorar os dados e processos do governo.
1.2. Identificar as partes interessadas
Outra
recomendação identificada nos processos de
publicação de dados consiste na correta identificação dos atores
interessados na publicação de dados. O processo da Colômbia
recomenda, de um modo geral, a identificação das partes
interessadas. O processo brasileiro acrescenta que esta identificação
deve estar contida num plano de abertura de dados governamentais,
devendo ser relacionadas e engajadas as principais partes
interessadas. O processo COMSODE complementa que esta identificação
deve ser feita dentro e fora da organização publicadora, visando
registrar as percepções da ótica de quem publica e de quem consome
os dados, gerando sinergia e engajamento entre publicadores e
consumidores.
Ademais,
negligenciar esta recomendação pode resultar num impedimento ao
início do processo de abertura e publicação de dados. É
necessário saber quem são os atores com poder de decisão para
estimular ou inviabilizar o processo. Do ponto de vista técnico,
deve-se identificar quem são os atores que possuem capacidade e
disposição técnica para atuar no processo, e ainda, é
recomendável a identificação dos principais consumidores dos
dados, de tal maneira que a oferta de dados a ser gerada seja
coerente com as expectativas e suas demandas.
É importante ressaltar
que, especialmente quando da abertura de dados que ainda não foram
publicados, poderá haver uma tarefa dispendiosa e tediosa que
demandará um contato mais intenso e negociado com os “proprietários"
dos dados para que seja concedido o acesso aos mesmos [7].
Tal
situação enfatiza a importância do desenvolvimento da etapa de
preparação das partes interessadas, especialmente para a publicação
de dados que ainda não foram abertos.
1.3. Definir perfis profissionais a serem envolvidos
Alguns
processos recomendam que sejam definidos os perfis profissionais a
serem envolvidos com o processo de abertura e publicação. O
processo do Brasil sugere que sejam envolvidos os gestores das áreas
responsáveis pelas bases de dados que serão objetos da abertura,
especialistas com conhecimento do negócio, o gestor da área de TI e
os desenvolvedores e analistas de dados que tenham conhecimento da
base de dados. O processo do Equador recomenda que seja estabelecido
um “Comitê de Dados Abertos" para cada instituição
publicadora, que deve ser composto pelo Diretor de Tecnologia da
Informação, o Coordenador de Planejamento, o Coordenador Jurídico
e representantes em nível técnico para atividades de apoio e
assessoramento.
Este
comitê tem como atribuições a localização, identificação,
catalogação, publicação e atualização de dados abertos
publicados no Portal Equatoriano de Dados Abertos.
O
processo COMSODE não apresenta especificamente quais profissionais
devem ser envolvidos no processo de publicação, todavia, estabelece
a existência de vários papéis profissionais que serão
desempenhados pela equipe técnica envolvida e que possuirão alguma
responsabilidade ao longo das etapas deste processo de abertura, que
são: Publicador, Proprietário dos dados, Curador, Proprietário do
Catálogo de Dados Abertos, Coordenador de Dados Abertos, Publicador
do Catálogo de Dados Abertos, Profissional de TI, Gestor de
Qualidade de Dados, Especialista de Qualidade de Dados e Especialista
Jurídico.
O
processo da Colômbia estabelece a definição de uma equipe de
trabalho, estabelecendo com clareza os perfis profissionais que devem
ser envolvidos, suas atribuições com as atividades de publicação
de dados e ainda, os momentos de atuação de cada perfil
profissional ao longo de todo o processo, conforme esclarecido na
Figura 1. Este processo sugere o engajamento de profissionais com
perfis de negócio, de tecnologia da informação, gestão da
qualidade e riscos, jurídico e de comunicação, destacando que
devem ser estabelecidos estes papeis ao longo do projeto,
independente do cargo que tais profissionais ocupem, sendo permitido
o acúmulo de papéis por um mesmo profissional.
Figura
1 - Papéis e atividades necessárias para desenvolver a publicação
de dados no processo da Colômbia [3]
1.4. Definir grupos de usuários dos dados
Além
da identificação das partes interessadas e dos perfis
profissionais, os processos do Brasil e o COMSODE também recomendam
a identificação e envolvimento, quando possível, dos principais
grupos de usuários dos dados. O processo do Brasil estabelece, de
forma geral, que estes usuários costumam ser os próprios órgãos
governamentais, empresas e especialistas. O processo COMSODE
identifica estes como: Órgãos governamentais e seus servidores;
Empresas; Organizações não governamentais e associações que
atuam com controle social, acompanhamento e fiscalização das ações
do setor público; Desenvolvedores de aplicativos; Jornalistas;
outras organizações, como bancos e instituições do mercado
financeiro; os próprios funcionários do órgão governamental
publicador; Comunidade acadêmica; E ainda, cidadãos de um modo
geral [4].
1.5.
Elaborar um plano de ações para publicação dos dados
Para
organizar e estruturar as atividades ao longo do processo de abertura
e publicação dos dados, vários processos recomendam a elaboração
de um plano de ações. Os processos do Brasil, da Colômbia e o
COMSODE estabelecem que deva existir inicialmente um plano de
abertura de dados governamentais recomendando ainda que este plano
deve ser detalhado mediante o estabelecimento de uma matriz de
responsabilidades pelo preparo e atualização dos dados e respectivo
detalhamento com metas e prazos.
No
processo do Equador, compete a um comitê de dados abertos criar e
executar um planejamento para a publicação dos dados abertos da
instituição publicadora, contemplando a conversão dos dados
disponibilizados em seções de Transparência Pública para formatos
abertos bem como identificar outros dados de interesse público que
possam ser ofertados em formato aberto.
Complementarmente,
é desejável que os usuários dos dados sejam engajados no
desenvolvimento do plano de ações. A participação dos usuários
permite a obtenção de informações a respeito da real demanda por
dados. Esta identificação da demanda também poderá ser utilizada
para subsidiar as atividades de seleção e priorização dos dados a
serem abertos. Dentre as principais técnicas de engajamento que
podem ser utilizadas destacam-se: enquetes, questionários, escolha e
priorização online de uma lista pré-estabelecida de conjuntos de
dados, workshops, audiências públicas, conferências, dentre
outros [4].
1.6. Capacitar os envolvidos
Considerando
a identificação e engajamento prévio dos atores nas atividades de
publicação de dados, o processo do Brasil destaca a importância de
capacitar os técnicos e responsáveis nas áreas de negócio dos
dados selecionados para abertura sobre alguns temas como: (1) O
processo de publicação de dados abertos; (2) O processo de
catalogação dos metadados no Portal Nacional de Dados Abertos
e a inclusão de dados em Infraestruturas Nacionais de Dados
Espaciais, quando se tratarem de dados geoespaciais [1].
Daremos
continuidade na apresentação de recomendações para a publicação
de Dados Abertos Conectados nos próximos artigos desta série.
Até
a próxima!!!
* Este artigo foi
desenvolvido a partir da pesquisa de Mestrado “Uma Proposta de Modelo de
Processo para Publicação de Dados Abertos Conectados Governamentais”, de
autoria de Thiago José Tavares Ávila, no âmbito do Programa de Pós-Graduação em
Modelagem Computacional do Conhecimento, do Instituto de Computação da
Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
[1]
ÁVILA, T. J. T. Uma proposta de modelo de processo para
publicação de dados abertos conectados governamentais. 223 p.
Dissertação (Mestrado) — Instituto de Computação, Universidade
Federal de Alagoas, Maceió, Alagoas, Brasil, 2015. Dissertação de
Mestrado em Modelagem Computacional do Conhecimento.
[2]
BRASIL. Manual para Elaboração de Plano de Dados Abertos. [S.l.],
2014. v. 7, 38 p. Disponível em:
<http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/governo_aberto/manual_elaboracao_plano_dados_abertos.pdf>.
[3]
COLOMBIA. Guía para la apertura de datos en Colombia. [S.l.],
2012. 67 p. Disponível em:
<http://programa.gobiernoenlinea.gov.co/apc-aa-files/da4567033d075590cd3050598756222c/Datos
Abiertos Guia v2 0.pdf>.
[4]
COMSODE. Methodology for publishing datasets as open data -
COMSODE. [S.l.], 2014.1-31 p. Disponível em:
<http://www.comsode.eu/index.php/deliverables/>.
ECUADOR.
Guia de Política Pública de Datos Abiertos. [S.l.], 2014. 21
p. Disponível em:
<http://www.gobiernoelectronico.gob.ec/wp-content/uploads/2014/12/GPP-DA-v01-20141128-SNAP-SGE.pdf>.
[5]
LBC. Open data and use of standards: Towards a Better Supply and
Distribution Process for Open Data. . [S.l.], 2012. Disponível
em:
<https://www.forumstandaardisatie.nl/fileadmin/os/documenten/Internationale
benchmark_v1_03_final.pdf>.
[6]
W3C. Best Practices for Publishing Linked Data. 2014. Acessado
em 02/05/2017. Disponível em: <http://www.w3.org/TR/ld-bp/>.
[7]
VILLAZÓN-TERRAZAS, B. et al. Methodological guidelines for
publishing government linked data. Linking Government Data, p.
27-49, 2011.
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