Existe o
ditado popular que no Brasil existem leis que “pegam” e outras que “não pegam”.
E o que dizer de um decreto? Ainda mais um Decreto que tem a “ousadia” de
propor a simplificação da burocracia da Administração Pública Federal. Pois é,
dentre outros propósitos, esta é uma das intenções do recém sancionado Decreto
Federal 9.094/2017 que “Dispõe sobre a simplificação do atendimento prestado aos usuários dos serviços públicos, ratifica a dispensa do reconhecimento de firma e da autenticação em documentos produzidos no País e institui a Carta de Serviços ao Usuário”.
Inicialmente
algumas ponderações ao Decreto 9094. Não foi ele quem instituiu a Carta de
Serviços ao Usuário, mas sim o Decreto 6.932/2009, que foi conhecido pelo
apelido de “Decreto Cidadão” e que foi revogado pelo Decreto 9094. Inclusive,
alguns artigos e incisos do Decreto 9094 foram extraídos quase que na íntegra
do revogado "Decreto Cidadão".
Outra
ponderação relevante é que o Decreto 9094 revogou outro Decreto importante, o
5.378/2005 que instituía o Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização– GESPÚBLICA. Institucionalmente considero uma perda, pois o GESPÚBLICA trouxe
uma “marca” de qualidade na Gestão Pública relevante, em que pese ter perdido
força ao longo dos anos. Todavia, o GESPÚBLICA foi responsável por relevantes
conquistas na Administração Pública Brasileira, especialmente a Federal, como a
própria disseminação do conceito da Carta de Serviços ao Usuário e o Modelo de
Excelência em Gestão Pública.
Falando agora
dos vários pontos positivos do Decreto 9094, destaco inicialmente o seu
conceito central de “simplificação da vida do usuário do serviço público”. Já
no seu caput ele “ratifica a dispensa de reconhecimento de firma e da
autenticação em documentos produzidos no País”. Isto é um avanço enorme na
pesada cultura cartorial do Brasil. Lamentavelmente, no nosso país o cidadão é
sempre obrigado a comprovar para o Estado que as suas informações, informações
estas que o Estado já possui em inúmeras bases de dados, são realmente suas.
Além do custo financeiro desta exigência, existe o custo de tempo, papel, horas
de trabalho dos atendentes e conferentes e outros absurdos não mais cabíveis
nos tempos atuais.
E de que
maneira o Estado comprovará que as informações apresentadas pelos cidadãos são
válidas? Fazendo o óbvio: consultando as informações que o próprio Estado já
possui em suas bases e fazendo cumprir a legislação de presunção de boa-fé.
Agora, como o Estado irá consultar as informações que já possui, em bancos de
dados que dificilmente se comunicam será um desafio, mas o Decreto determina
que haja a “aplicação de soluções tecnológicas que visem a simplificar
processos e procedimentos de atendimento aos usuários dos serviços públicos e a
propiciar melhores condições para o compartilhamento das informações”
(Art. 1º, VI) e todo um capítulo voltado a RACIONALIZAÇÃO
DE EXIGÊNCIAS E DA TROCA DE INFORMAÇÕES. Toda esta racionalização de
exigências será, em tese, simplificada pois a União já baixou em 2016 o Decreto
8.789 que “Dispõe sobre o compartilhamento de bases de dados na administração pública federal. ”
Os
artigos 11º e 12º reiteram a importância da Carta de Serviços ao Usuário, algo
que será bem menos difícil de ser cumprido considerando que o Governo Federal
já possui o Portal de Serviços do Governo Federal (www.servicos.gov.br) e encontra-se em
pleno desenvolvimento da Plataforma de Cidadania Digital instituída através do Decreto nº
8.936 e que objetiva a
ampliação e simplificação do acesso dos cidadãos brasileiros aos serviços
públicos digitais, inclusive por meio de dispositivos móveis. Neste contexto, o
Portal de Serviços do Governo federal (servicos.gov.br) se tornará o
canal único e integrado para a disponibilização de informações, solicitação
eletrônica e acompanhamento de serviços públicos.
Outro
item curioso (e legal) do Decreto 9094 é a criação do Simplifique!, onde o
usuário pode apresentar uma solicitação de simplificação de um determinado
serviço público quando este serviço não observar o disposto no Decreto 9094.
Apesar da forma tímida, o Art. 14º do Decreto 9094 proporciona que o usuário
pode, facultativamente, apresentar uma proposta de melhoria para o serviço que
ele considera ineficaz (Art. 14º, inciso V). Isto abre uma enorme janela de
oportunidades para a co-criação nos serviços públicos, ou seja, o cidadão pode
passar a pensar junto, com e pelo Estado, propondo serviços mais inteligentes,
ágeis e aderentes as suas necessidades.
Se o
Estado for ousado e valorizar o potencial do inciso V do Art. 14º, poderemos
ter uma das maiores revoluções de qualidade no serviço público federal
brasileiro.
Isto pode gerar muitas, mas muitas oportunidades para que novos
procedimentos, soluções tecnológicas, aplicativos e outras eteceteras possam
ser utilizadas para um serviço público mais ágil, inovador, proativo e acima de
tudo, com o protagonismo do cidadão junto ao Estado.
Enfim, o
Decreto 9094/2017 vem somar com outros recentes avanços institucionais do
Estado Brasileiro, especialmente com a Lei 13.460/2017 (assunto do meu último post aqui no blog), que instituiu o “Código
de Defesa do Usuário do Serviço Público”. Que o Decreto seja cumprido na integra não
apenas como mais uma obrigação do Estado, mas como uma grande oportunidade para
modernização e inovação nos serviços públicos federais.
Divulgue
e discuta este Decreto com seus pares. Vamos fazer o Decreto 9094 “pegar” de
verdade. Façamos valer este grande direito que gera grandes benefícios para
todos os brasileiros.
Até a próxima!!!
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