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FACIN – Uma Experiência de Construção Coletiva de Conhecimento em Arquitetura Corporativa

por Antonio Plais

Há cerca de dois anos fui convidado para participar de uma experiência desafiadora: contribuir para a construção de um framework de arquitetura corporativa para o Governo Federal, juntamente com um grupo de voluntários e servidores do SERPRO. Quando olho para trás, relembro as primeiras reuniões, e vejo o que conseguimos fazer neste tempo, não posso deixar de sentir uma ponta de orgulho e satisfação pelo trabalho realizado. Mas, agora, o sentimento que me oprime é o de perda, e escrever sobre esta perda é a tarefa a que me imponho nesta postagem.

Para aqueles que não estão familiarizados com a história do FACIN-Framework de Arquitetura Corporativa para Interoperabilidade no Apoio à Governança, eu recomendo acessar o site do Governo Digital, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, que contém um extenso material sobre o seu desenvolvimento e as últimas versões dos documentos que o compõem. Gostaria de realçar o seguinte trecho, que declara os objetivos do FACIN:
O FACIN tem por objetivo construir uma visão consistente dos modelos de representação das capacidades de cada organização governamental. Por meio do estabelecimento da Arquitetura Corporativa e de padrões de interoperabilidade, o FACIN apoiará a Estratégia de Governança Digital Brasileira (EGD), ampliando a colaboração entre as organizações do Governo Federal e melhorando a eficiência dos serviços de governo eletrônico para a sociedade (cidadãos, governos, organizações e empresas). Como padrão, incorporado à Arquitetura ePING de Interoperabilidade, o FACIN atuará como uma referência para os diversos órgãos da Administração Pública Federal (APF).
Quando me inteirei mais sobre o trabalho que já havia sido realizado, o quanto ainda estava para ser feito, e quais eram as razões, justificativas e benefícios desta iniciativa, não pude resistir ao chamado. Várias razões se somaram para que eu tomasse a decisão de dedicar algumas (várias) horas do meu tempo (sem remuneração) a esta empreitada. A mais forte delas, a perspectiva de poder ajudar a criar um corpo de conhecimento em arquitetura corporativa que pudesse ajudar as empresas e órgãos da Administração Pública Federal do Governo Brasileiro a se tornarem mais eficientes e prestarem um melhor serviço para nossa população. Com mais de quarenta anos de estudo e prática nas áreas de tecnologia da informação, administração e arquitetura corporativa em empresas privadas, senti que era chegada a minha hora de oferecer uma modesta contribuição para o bem do serviço público.

O ano de 2016 foi exaustivo, tomado pela construção do Modelo de Referência do FACIN. Baseado no framework TOGAF, mas adaptado para as necessidades das entidades do Governo, demos forma ao que hoje conhecemos como as nove visões do FACIN. Sob a batuta do Marcus Vinicius da Costa, Coordenador no Grupo de Interoperabilidade do SERPRO, mentor e principal patrocinador da construção do FACIN, cada profissional do grupo colocou o melhor de si e dos seus conhecimentos neste documento. Foram horas e horas intermináveis de estudo, escrita, discussão, revisão, e mais estudo, escrita e discussão, até chegarmos a um documento que espelhasse o nosso melhor entendimento sobre cada uma destas áreas. Ao final, quando colocamos o documento em consulta pública e realizamos o IV Fórum de Governança – O FACIN como padrão ePING, sabíamos que havíamos estabelecido uma excelente fundação onde firmar o edifício que estávamos construindo.

As nove visões do FACIN

O ano 2017 foi muito gratificante para o grupo. A ABEP-Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Tecnologia da Informação e Comunicação demonstrou profundo interesse pela aplicação do FACIN na esfera Estadual, e duas oficinas de validação dos modelos foram realizadas com grande sucesso, uma delas envolvendo diretamente a Secretária de Tecnologia da Informação e Comunicações do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - SETIC/MPDG. Em paralelo, o grupo desenvolveu os Modelos de Conteúdo do FACIN, que detalharam os conceitos e elementos de modelagem das diversas visões. Em novembro de 2017, aconteceu o V Fórum: O uso do FACIN na Administração Pública, quando os excelentes resultados alcançados até o momento puderam ser divulgados para a comunidade. O FACIN passou por uma terceira rodada de consulta pública, e as perspectivas de trabalho para 2018 pareciam as melhores.

Em paralelo ao desenvolvimento dos documentos pelo grupo de voluntários, vários órgãos e empresas começaram a olhar com interesse para o FACIN.  A Secretaria do Tesouro Nacional, PRODEMGE (Empresa de Tecnologia da Informação do Governo de Minas Gerais), ATI-PE (Agência Estadual de Tecnologia da Informação - Pernambuco), Ministério da Justiça, Caixa Econômica Federal - CEF, Câmara dos Deputados, Senado Federal, Prefeitura de Itu, Correios e outros, se aproximaram do grupo de desenvolvimento do FACIN, e as primeiras experiências de adaptação e implementação do framework tiveram início. Várias iniciativas do Governo Federal apontavam para a modernização da administração pública através da implementação efetiva do chamado Governo Eletrônico, com destaque para a Estratégia de Governança Digital (EGD) e para a Estratégia Brasileira para a Transformação Digital, conhecida como E-Digital, recentemente publicada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). A demanda projetada de recursos para implementação do FACIN levou o SERPRO a iniciar estudos para a montagem de um laboratório de experimentação e conhecimento do framework e de ferramentas de apoio, com o intuito de prestar serviços de implementação da arquitetura corporativa através de todo o Governo Federal. O grupo de desenvolvimento se preparava para iniciar mais uma etapa dos trabalhos, agora com uma participação ainda maior de pessoas ligadas aos órgãos do Governo, para o desenvolvimento do modelo de Governança do FACIN.

Chego, aqui, ao momento de perda a que me referi na introdução desta postagem: o desenvolvimento do FACIN, por determinação da direção do SERPRO, está suspenso para dar lugar a outras prioridades. Em meio ao turbilhão que vem tragando sucessivas administrações na esfera federal, o FACIN perde a sua sustentação e ficam perplexos todos os que se engajaram e apostaram em uma nova forma de enfrentar os problemas históricos que afligem o Brasil. Como declarei há algum tempo: 
...a arquitetura corporativa ainda é, geralmente, mal compreendida em relação ao seu uso, origem e proposição de valor. Enquanto a disciplina amadurecia ao longo dos últimos anos, os mitos que rodeiam a disciplina também cresciam. A confusão se deve, em parte, à perpetuação de tentativas de implementação sem o suporte de metodologia, abordagem e ferramentas sólidas, mesmo por parte de equipes e empresas bem-intencionadas. 
Recentemente li um artigo sobre um dos mitos mais persistentes em algumas organizações, que declara que “nós não precisamos de arquitetura corporativa na nossa empresa”. Não vou me alongar, aqui, para refutar este equívoco; uma atenta leitura do FACIN (e de outros materiais de referência) deveria ser suficiente para mostrar o quanto esta declaração está longe da verdade. Exemplos de Governo Eletrônico em outros países, como os Estados Unidos, a Holanda, Singapura e, principalmente, a Estônia, não deixam dúvidas sobre a importância de um framework e metodologia sólidos de arquitetura corporativa para o sucesso destes Países. O FACIN procurou, respeitando as nossas características locais, buscar inspiração nestes casos de sucesso. Muita coisa ainda havia para se estudar, discutir e trabalhar, mas tudo isso ficará para um futuro incerto.

Não poderia deixar de registrar nesta postagem o imenso prazer e gratificação que tive de participar deste grupo. Sentirei enorme falta das discussões com o Alexandre Coutinho, a Valéria Musafir, a Vanessa Nunes, o Carlos Teixeira, o Guttemberg Passos e, principalmente, o Marcus Vinícius da Costa. Com todos aprendi muito, fui desafiado a dar o meu melhor, compartilhei minhas experiências e meus conhecimentos e, acima de tudo, dividi o sonho de construir uma metodologia que ajudasse o Brasil a se tornar um País melhor, mais justo e mais humano, onde o Governo pudesse oferecer serviços de qualidade nesta nova era da integração eletrônica, dos serviços digitais, e da população permanentemente conectada. Isso me consola, e me faz acreditar que, algum dia, o FACIN renascerá e se tornará realidade, cumprindo seu destino e ajudando o Governo Brasileiro a se reinventar para, quem sabe, finalmente adentrar uma era de prosperidade, modernidade e eficiência.

Meu grande e respeitoso muito obrigado a todos que lutaram juntos a boa batalha!
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Comentários

  1. Belo artigo, Plais! Muito aprendi com seus ensinamentos e dos demais participantes deste belo projeto! Fico aqui na esperança de que, em breve, retornemos com nossas ótimas discussões, em prol de melhores serviços para a sociedades, nossos filhos, netos...

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  2. Plais, foi um prazer interagir com você e todos os integrantes deste grupo tão rico! Agradeço ao Marcus Vinícius por nos conectar e fortalecer esta conexão durante todo este tempo. Também acredito no potencial do FACIN e na base sólida que ele já alcançou e espero que o seu desenvolvimento seja retomado com força total tão logo esta penumbra se finde.

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  3. VÃO VENDO...
    "...finalmente adentrar uma era de prosperidade, modernidade e eficiência."
    Chegaremos lá!
    Em outubro passaremos o rodo nesses golpistas que não querem ver a Nação prosperar.
    Entraram no governo para interromper projetos e vender o que nos resta!

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  4. Infelizmente, a agenda política atropela todas as iniciativas e, mais infelizmente ainda, quando essa agenda política não enxerga quando a iniciativa suspensa é aquela que mais poderia contribuir com essa mesma agenda política. No caso, estamos falando de "Governo Digital" e o FACIN poderia ajudar e muito a concretizar essa agenda. Uma pena, mas vamos torcer para que os trabalhos voltem!

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